Semiárido

Semiárido Piauiense: principais características

Elmo de Souza Lima

O Semi-árido piauiense abrange uma área de aproximadamente 150.842 km², correspondendo a 57% da área total do Estado e a 13,96% da área do Semi-árido brasileiro. Abrange 151 municípios , cerca de 70% da população piauienses, totalizando uma população de 1.219.965 de pessoas (LIMA; ABREU, 2007), conforme demonstrado na Figura 01.

É uma região de clima meio árido, marcada pela irregularidade de chuvas, cujo volume varia entre 500 a 700mm anuais. Predomina em sua vegetação a caatinga, um tipo de mata pouco densa, composta por árvores de pequeno porte e que se desfolham completamente na estação seca como forma de adaptação às condições geoambientais da região (FERREIRA, 1986).

Segundo Silva (2007, p. 470), “o Semi-árido tem sido histórica e socialmente marcado pelas duradouras contradições e injustiças sociais. Os indicadores sociais nas áreas de saúde, educação e renda são os piores em relação à média nacional”. Estudos realizados sobre essa região por Furtado (1980); Silva (2007); Sousa (2005); dentre outros, demonstram que a maioria dos problemas sociais e econômicos, por ela vivenciados, decorre da estrutura excludente que predomina no Nordeste, baseada na concentração da terra e da água e na dificuldade de acesso aos meios e recursos necessários à produção agrícola e à pecuária.

Diante dessa realidade, o Semi-árido caracteriza-se como uma região que concentra grande parte da população de baixa renda e os mais baixos indicadores sociais do Brasil. Segundo dados do UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), de cada 5 (cinco) pessoas que vivem nesta região, 4 (quatro) pertencem a famílias cuja renda per capita é menos que 0,5 salário mínimo (GOMES FILHO, 2003). No entanto, como defende Silva (2007, p. 471),"[...] não se trata de, mais uma vez, atribuir à seca toda a culpa pelos baixos índices de desenvolvimento humano no Semi-árido. As análises realizadas identificam a persistência das desigualdades sociais que está na base da reprodução secular das condições de miséria que fragilizam as famílias sertanejas, impedindo-as de resistir aos efeitos das estiagens prolongadas".

Apesar de ser mais conhecido em razão de seu ao alto índice de pobreza, o Semi-árido tem grandes potencialidades, tanto na área turística quanto na área da produção de alimentos, tais como o mel, o caju, a caprinocultura, a apicultura e tantas outras atividades que se adaptam às características geoambientais da região.

Os principais problemas do Semi-árido não são decorrentes, somente, das questões climáticas e ambientais, porém, dos processos sociais e políticos vivenciados historicamente. Desde a colonização, essa região vem sofrendo com a degradação do meio ambiente que passou a ser devastado em razão da intensa criação de gado, provocando o desequilíbrio ambiental. Por outro lado, a grande concentração de terra e água nas mãos de pequenos grupos político e econômicos, aspectos que consolidaram o processo de dominação política pautado no autoritarismo e no abuso de poder dos “coronéis”, contribuiu definitivamente para a implementação de uma cultura política baseada na submissão, no clientelismo, no paternalismo e no comodismo (SOUSA, 2005).

Com o amplo desenvolvimento das regiões no Sul e Sudeste do país, o Nordeste brasileiro começou a perder prestígio político e os coronéis passaram a enfrentar diversos problemas financeiros, assim, trataram de construir um novo instrumento que garantisse a acumulação de riqueza e poder. Passaram então a disseminar um novo discurso sobre a região, caracterizando-a como espaço da fome e da pobreza, concepção amplamente difundida pelos meios de comunicação, passando a fazer parte do imaginário social do país. A partir desse novo instrumento de luta, a bandeira da fome e da miséria do Nordeste, as elites regionais sensibilizaram governos e organismos internacionais, com o objetivo de obter recursos a fim de acabar com a fome e a pobreza na região (SILVA, 2006).

Confirmando essa lógica, Sousa (2005, p. 55) afirma que:"[...] de fato, enquanto as populações subordinadas constituíam os flagelados, os coronéis instrumentalizavam a seca como força de pressão para conseguir verbas federais, as quais, em grande parte, abasteciam os cofres desses coronéis que haviam perdido a posição de cabeça do pólo econômico para o Sul. Eis a lógica da chamada indústria da seca".

As políticas públicas desenvolvidas com base na indústria da seca utilizam os recursos conquistados junto ao governo federal para oferecer carros pipas, cestas de alimentos e outras ações assistencialistas, como forma de ampliar os vínculos de dependência entre as populações locais e os velhos e novos “coronéis” do Nordeste (SOUSA, 2005).

Entretanto, verificamos que o discurso sobre o Semi-árido como espaço de pobreza e miséria também foi incorporado às narrativas educacionais, constituindo no imaginário da sociedade brasileira, uma suposta verdade sobre essa região, que nem sempre condiz com a situação vivenciada por sua população.

Equívocos como este nos alertam para a necessidade de rediscutirmos os valores culturais e políticos, que norteiam as práticas educativas e sociais no Semi-árido, principalmente, os processos de formação de professores, no sentido de se reconstruir um novo olhar sobre a região, que evidencie, além dos aspectos de dominação e de opressão, elementos mais positivos e menos degradantes, coisas boas e bonitas que estão espalhadas nos vários cantos do sertão nordestino, seja nas casas humildes da sua gente, seja nos espaços de celebrações religiosas e culturais, na flora e na fauna da caatinga, seja na inocência criativa de suas crianças.

Não podemos construir esses caminhos sem olhar para as veredas abertas em meio a esse vasto, complexo e diverso mundo que é o Semi-árido piauiense. Não há como construir novos conhecimentos sobre essa região sem considerar os saberes milenares, transformados em sabedoria popular, construídos e experimentados ao longo de várias gerações. Torna-se extremamente importante conhecer a tradição cultural construída por essa população como forma de articular as políticas de desenvolvimento para essa região com esse conjunto de saberes e práticas construídos durante décadas.

Neste caso, olhar para o Semi-árido piauiense implica abertura para compreender, não só os aspectos que estão mais evidentes, mas, principalmente, aqueles que parecem adormecidos, silenciados, ofuscados e difusos em meio às paisagens secas por força da natureza e, mais ainda, por força dos processos históricos de dominação, secularmente instituídos, subtraindo dessas populações o prazer de experimentar o gosto da liberdade, da democracia e da autonomia.


A Vegetação do Semiárido

A principal vegetação do semi-árido piauiense é a caatinga, que na linguagem indígena é chamada de "Mata Branca". Ela ocupa o Sul e o Sudeste do Estado, de clima semi-árido, constituída de vegetais xerófilas (adaptadas a pouca umidade), de solos secos, rasos e pedregosos.
A maioria dos vegetais da região acumula água em seus caules durante o período chuvoso para poderem sobreviver no período de estiagem. Apresenta também árvore e arbustos com muitos galhos e de folhas pequenas.

De acordo com os dados da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMAR), no Estado do Piauí, quase 70% da população habita nas regiões dominadas pelo bioma Caatinga e desenvolvem suas atividades econômicas e cotidianas neste ambiente. O bioma Caatinga representa 28,4% da vegetação do território e envolve 63 municípios.

Ainda de acordo com os dados da SEMAR, a Caatinga piauiense é bastante rica na diversidade de espécie de animais, registrando 932 espécies de animais e 20 gêneros de plantas exclusivos da Caatinga. Entre eles, 44 espécies de lagartos, quatro de quelônios, três de crocodilos, 47 de anfíbios. A diversidade da fauna local também pode ser conferida no número de aves. Atualmente, já foram registradas 348 espécies, entre elas as aves carcará, anum, jaçanã e gavião turuna entre outros. Vinte espécies estão ameaçadas de extinção, entre elas a ararinha-azul e a arara-azul-de-lear.

A Caatinga também possui muitos mamíferos. Atualmente, de acordo com pesquisa realizada pela equipe da Semar, existem cerca de 148 espécies, entre elas, o rato-de-fava, a raposa, o gato maracajá e o guaxinim. Das espécies nativas da Caatinga as mais encontradas no Piauí são o mocó, o tatu-peba e o preá.

Outro dado importante é que a Caatinga piauiense abriga algumas das mais importantes áreas de preservação deste bioma: o Parque Nacional da Serra da Capivara e a Serra das Confusões localizadas na região Sul do Estado. Os principais representantes da flora da Caatinga do Piauí são a catingueira, o marmeleiro, o velame, a jurema preta e branca, o mufumbo e o pau-ferro. Além desses, destacam-se também a aroeira, marmeleiro, xiquexique, mandacaru, pau-pereira, unha-de-gato, dentre outros. Os cactos são os vegetais típicos da região.

A paisagem da Caatinga é vista por muitos como pobre por ser dominada por formações vegetais secas e árvores de porte baixo ou médio (3 a 7 metros de altura), principalmente no período de seca, quando as folhas das plantas caem totalmente. No entanto, após as primeiras chuvas, o verde da vegetação e a floração aparecem, redefinindo a paisagem com todo o vigor da diversidade biológica, dando vida aos animais e aos sertanejos.

A vegetação de caatinga é bastante diversificada e rica, mas, de modo geral, tem sido devastada intempestivamente para consumo de lenha e no desmatamento para áreas de agricultura. Desde a colonização do Piauí que a vegetação de caatinga vem passando por um processo amplo de devastação, seja para a criação de gado, ou para a produção agrícola. Cerca de 80% da caatinga piauiense está devastada, restando somente 19,4 % que ainda estão preservadas, seja em parque de preservação ou em áreas particulares pouco utilizadas.

Características do Solo


No semi-árido piauiense predomina basicamente dois tipos de solo: o cristalino, formado por rochas cristalinas, que ocupa somente 38.156 Km², 15% do território estadual e o solo sedimentar ou arenoso, que predomina em 213.844 Km², 83% do território piauiense, favorecendo a produção agrícola e a acumulação de grande volume de água no sub-solo. Na área de solo cristalino, a disponibilidade de água no subsolo é limitada, os solos são rasos e de média a baixa fertilidade natural.

O solo do Piauí é, em geral, de média a baixa fertilidade natural, mas apresentam grande potencialidade agrícola, devido às condições físicas e topográficas. A complexidade da área do semi-árido piauiense também é marcada pelos diferentes tipos de solos, embora, no geral, sejam rasos e com limitações ao uso agrícola.



Referências

GOMES FILHO, José Farias. Crianças e adolescente no Semi-árido Brasileiro. Recife: Unicef, 2003.

LIMA, Elmo de Souza. A formação continuada de professores no Semi-árido: valorizando experiências, reconstruindo valores e tecendo sonhos. 2008. 240f. Dissertação. (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Piauí, Teresina, 2008.

LIMA, Iracilde Maria de Moura Fé; ABREU, Irlane Gonçalves de. O Semi-árido piauiense: vamos conhecê-los? Teresina: EDUFPI, 2007.

SILVA, Roberto Marinho Alves da. Entre o Combate à Seca e a Convivência com o Semi-árido: políticas públicas e transição paradigmática. Revista Econômica do Nordeste. Fortaleza, v. 38, n. 3, p. 466-485, jul./set. 2007.

______. Entre o combate à seca e a convivência com o Semi-árido: transições paradigmáticas e sustentabilidade do desenvolvimento. 2006. 298 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento sustentável) – Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2006.

SOUSA, Maria Sueli Rodrigues de. Imaginário social de Semi-árido e o processo de construção de saberes ambientais: o caso do município de Coronel José Dias – Piauí. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente). Teresina: UFPI, 2005.

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