quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Vivemos tempos difíceis: mas o sonho não acabou


O país acordou num ambiente diferente, nesta quinta-feira, com o resultado do julgamento ocorrido ontem (24/01), no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre, que condenou sem prova o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 12 anos de reclusão.
Presenciamos, por um lado, a comemoração dos setores conservadores da sociedade, capitaneados pelos setores da mídia e da elite financeira, que apostam na exclusão do petista das eleições presidenciais de 2018 e, por outro, a revolta de setores populares que denunciam a perseguição política contra o ex-presidente.
Para aqueles que acreditam que a decisão de ontem foi uma derrota do ex-presidente Lula, podem estar redondamente enganados. Ao invés de abatimento, vejo ressurgir no meio popular uma grande indignação contra as injustiças históricas, cometidas pelas elites, contra as classes populares, sempre com a conivência de juízes e promotores.
Por essa razão, as mobilizações ocorridas em torno da defesa pública do ex-presidente e do seu direito de ser candidato, pode ser o começo de uma verdadeira luta política contra a imparcialidade da justiça brasileira e as injustiças históricas vivenciadas pelo povo brasileiro.
A sentença proferida pelo TRF-4, que condenou o maior líder político do Brasil sem apresentação de provas, faz ressurgir o sentimento de injustiça que a população excluída carrega dentro de si a partir da convivência diária com as práticas autoritários do poder judiciário. Com o discurso da imparcialidade, os juízes atuam nas periferias reafirmando este processo desigual, parcial e injusto de aplicação da lei que, em grande medida, nega à classe trabalhadora os direitos básicos garantidos constitucionalmente aos cidadãos brasileiros.
Não é por acaso que o fato ocorrido ontem não represente uma novidade para uma parcela significativa da população brasileira, que convivem há séculos com as injustiças ocorridas a partir das decisões tomadas pelo judiciário para atender aos interesses políticos e econômicos dos grupos dominantes.
Neste caso, o resultado do julgamento contra o ex-presidente Lula somente escancarou para o mundo uma prática corriqueira da magistratura brasileira, de comprometimento com os interesses dos senhores da Casa Grande. Os juízes do TRF-4 não agiram somente pela condenação do Lula, mas pela desconstrução de um projeto político de inclusão social e de emancipação das classes populares, iniciado em 2003.
Para os desavisados e ingênuos que comemoram a condenação do ex-presidente, é importante avisá-los que as únicas pessoas que verdadeiramente podem riem neste momento são os ricos deste país, que estão vendo a possibilidade concreta de aprofundar as práticas de opressão e escravização da classe trabalhadora, com a plena conivência do aparato do Estado, para manter seus privilégios.
Neste caso, se estes que comemoram agora não fazem parte deste grupo seleto e restrito, se não integra o grupo dos 5% da população que detém a maior parte da riqueza do país, podem veem seus sorrisos, em pouco tempo, se transformarem em tristeza com o aprofundamento da perda dos direitos trabalhistas, previdenciários e do acesso gratuito à saúde e educação.

Elmo de Souza Lima - Doutor em Educação e professor do Centro de Ciências da Educação da Universidade Federal do Piauí (UFPI).

quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

O papel da educação na construção de uma sociedade ética e democrática


Diante do cenário político e social que estamos vivendo no Brasil é comum nos deparamos com discursos moralistas que determinam como deveriam agir nossos políticos, atribuindo-lhes inúmeras regras de comportamentos éticos a ser adotados na condução e zelo da coisa pública. No entanto, quase não vejo reflexões que nos ajudem a compreender as raízes históricas destes problemas ou apontem as alternativas que possam realmente reduzir estes desvios éticos que estão na base da cultura política do povo brasileiro.
Cabe-nos perceber que essas fragilidades referentes as atitudes éticas não é exclusividade daqueles que ocupam cargos públicos, pois é algo que se tornou comum na vida cotidiana, amparado por valores relativistas e permissivos que convencionamos chamar de “jeitinho brasileiro”. Não é por acaso que estas atitudes antiéticas sejam consideradas por alguns como “virtude”, associada as habilidades e capacidades de alguns indivíduos de burlarem as regras sociais, estabelecendo uma relação de privilégio diante dos outros. Pasmem, mas estas atitudes chegam a ser consideradas uma destreza, comuns às pessoas “inteligentes” e “espertas”.
Por essa razão, compreendo que esta “falta de ética”, atribuída ao campo da política partidária, tem suas raízes na cultura política de uma parcela singificativa da população brasileira, sendo inclusive reforçada, em grande medida, pelo modelo de educação ou “deseducação” que oferecemos aos nossos jovens. Nos referimos aqui a educação no seu sentido amplo, que engloba os processos de socialização de valores e conhecimentos difundidos às novas gerações, pelas diferentes instituições sociais, escolares e acadêmicas, centrados boa parte deles dentro de uma lógica individualista voltados ao sucesso individual, em detrimento do bem comum.
Nessa perspectiva, parte das soluções que se busca para os problemas éticos no campo da política governamental ou partidária, podem estar exatamente naquilo que compõe a base cultural e política da sociedade, a educação. É exatamente por meio dos valores, conhecimentos e princípios ético-políticos que apresentamos e vivenciamos com os jovens, como modelo a ser seguindo que vão definir em certa medida as suas práticas e atitudes na esfera social.
Este processo de crise social no qual estamos inseridos, refletidos por meio da corrupção, violência, intorelância, ódio e desesperança, constitui-se num alerta quanto a urgência de fazermos um debate sério com a sociedade sobre a importância da educação na construção de outro modelo de sociabilidade pautado em princípios éticos, solidários e democráticos. No entanto, este debate precisa superar os clichês da mídia, de soluções fáceis, rápidas e superficiais, buscando estabelecer um pacto político entre os vários setores políticos e sociais com o compromisso de discutir um projeto de educação que promova uma revisão crítica destes valores e conhecimentos que dão sustentação a este modelo sociadade que tanto criticamos.
Neste contexto, pensar a construção de uma nação ética e justa passa pelo desenvolvimento de projetos de formação cultural e política que oportunizem aos cidadãos a vivência e a incorportação destes princípios em suas práticas sociais. Um projeto de educação voltado à construção de novos referenciais ético-políticos e culturais que se constituam nos pilares deste projeto de sociedade, menos injusto e desigual.
Em alguns países com democracias consolidadas, a educação pública é compreendida como um instrumento político de promoção da equidade e da democracia, portanto um patrimônio nacional. No Brasil, não podemos continuar com essa racionalidade meramente utilitarista e mercantilista da educação, assumida por parte da classe média brasileira, que a veem como um instrumento de manutenção do "status quo" e da distinção entre classes sociais. Uma racionalidade que nega a importância política e cultural da escola pública e dar prioridade ao ensino privado como forma de consolidar um modelo de segregação social. Só teremos um país verdadeiramente democrático quando tivermos a capacidade de construir uma educação pública, gratuita e de qualidade para todos.
É claro que não podemos ser ingênuo em acreditar que a educação sozinha tem o poder de tranformar a sociedade. Mas como dizia Paulo Freire, a educação sozinha não transforma a sociedade, mas sem ela tampouco a sociedade muda, pois a educação transforma as pessoas que se tornam agentes de transformação da sociedade.
Se realmente quiseremos transformar o nosso país numa nação ética e democrática, precisamos repensar urgentemente os princípios políticos que dão sustentação os projetos educativos implementados em nossas instituições educativas, sejam escolas e universidades ou outras organizações sociais, que atuam direta e indiretamente na formação cultural e política da população.


Elmo de Souza Lima - Doutor em Educação e professor do Centro de Ciências da Educação da Universidade Federal do Piauí (UFPI).

terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Semiárido concentra maior taxa de analfabetismo do Brasil

De acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no final de dezembro de 2017, o Brasil tem 11,8 milhões de analfabetos, o que representa 7,2% da população de 15 anos ou mais de idade, denominado de taxa de analfabetismo.
Na região Nordeste, a taxa de analfabetismo chega a 14,8%, o dobro da média nacional. É também quase quatro vezes maior do que as taxas estimadas para as regiões Sudeste (3,8%) e Sul (3,6%), que exibem os melhores indicadores. Dos 11,8 milhões de analfabetos, 6,5 milhões estão na região Nordeste, o que significa metade do total nacional.
Diante das condições de pobreza e descaso com as políticas educacionais, os municípios do semiárido apresentam taxas de analfabetismo superiores a média do Nordeste, resultando num ciclo preocupante de negação de direito e abandono da população nas condições de miséria. Para o IBGE, quanto maior o índice de analfabetismo menor o nível de renda e de desenvolvimento do território.
O desafio para reduzir o analfabetismo segue concentrado nos mais idosos. Entre pessoas com 60 anos ou mais, a taxa de analfabetismo chega a 20,4%. Isso equivale a 6 milhões de pessoas. No semiárido, este índice é ainda maior e está associado ao processo de exclusão de uma geração de pessoas que não tiveram o acesso à escola em suas comunidades, devido à ausência de políticas efetiva de educação nos municípios daquela região.
Entre as pessoas pretas ou pardas, a taxa de analfabetismo dobra. Das pessoas brancas de 15 anos ou mais, 4,2% são analfabetas. Dos pretos ou pardos nessa faixa etária, 9,9% são analfabetos. Uma em cada três pessoas que se declararam de cor preta e parda com 60 anos ou mais era analfabeta, em 2016.
De acordo com a analista do IBGE, Helena Oliveira Monteiro, a pesquisa mostra a continuidade das diferenças regionais e a desigualdade por cor ou raça. Historicamente, pessoas brancas têm mais acesso à escola. Isso está associado à renda, que produz maior oportunidade de acesso ao ensino”, disse a pesquisadora.

Nível de escolaridade

No Brasil, 51% da população de 25 anos ou mais tinham até o ensino fundamental completo ou equivalente em 2016; 26,3%, o ensino médio completo, e 15,3%, o superior completo.
Já na região Nordeste, a pesquisa demonstra que 52,5% da população não alcançou o ensino fundamental completo, ao passo que na região Sudeste 51,1% tinham pelo menos o ensino médio completo.
A meta 9 do Plano Nacional de Educação (PNE), lei sancionada em 2014, previa a redução da taxa de analfabetismo para 6,5%, em 2015 no país, o que não foi alcançado, conforme mostra a Pesquisa Nacional do IBGE.
Para a analista do IBGE Marina Aguas, as políticas públicas de redução do analfabetismo devem focar as regiões Norte e Nordeste. No país, a taxa de analfabetismo para os homens de 15 anos ou mais de idade foi 7,4% e para as mulheres, 7%.
Os baixos índices de escolarização da população do semiárido tem impactos significativos no processo de desenvolvimento da região. Os estudos demonstram que quando maior o nível de formação das pessoas, maior a organização política e o controle social das políticas públicas, favorecendo a garantia dos direitos da população e a construção de projetos estratégicos de desenvolvimento.