segunda-feira, 27 de outubro de 2014

As eleições e as perspectivas de desenvolvimento no semiárido

Os debates construídos durante o processo eleitoral, associado ao resultado das urnas na última eleição, são extremamente favoráveis a continuidade e ao fortalecimento das políticas de desenvolvimento do semiárido centrada no princípio da convivência e sustentabilidade. A reeleição da presidente Dilma Rousseff foi fundamental à ampliação e consolidação do Programa Um Milhão de Cisternas e o Programa uma Terra e duas Águas voltadas a implementação de tecnologias sociais que permite a captação de água da chuva para a produção de alimento, ambos coordenados pela Articulação no Semiárido Brasileiro (Asa Brasil), em parceria com mais de 600 organizações sociais espalhadas pelos 09 estados da região.
Outro fator importante, neste contexto, foi a participação efetiva da população do semiárido brasileiro, com 1.133 municípios e 22 milhões de pessoas, na eleição da presidente Dilma. Um exemplo foi à mobilização política desenvolvida pela Asa Brasil, colocando mais de 30 mil pessoas em Petrolina/PE, no ato de apoio a reeleição do PT.
No âmbito dos estados, tivemos também vitórias importantes de governadores do Partido dos Trabalhadores nos três maiores estados do Semiárido (Bahia, Ceará e Piauí), considerando a extensão territorial, além do governador de Minas Gerais. No caso da Bahia, com a eleição de Rui Costa (PT) teremos a possibilidade de ampliação dos programas e projetos iniciados pelo governador Jaques Wagner na área da convivência com o semiárido.
Já no Piauí, o governador Welligton Dias, eleito para o seu terceiro mandato, é um entusiasta das políticas de convivência e iniciou em 2003 um conjunto de ações associada à construção de uma política de convivência no Estado. No entanto, as dificuldades técnicas do aparelho estatal e os problemas enfrentados na articulação interna no governo e no diálogo efetivo com a sociedade civil limitaram a consolidação destes projetos e programas. A partir desta experiência, espera-se que neste novo mandato se possa avançar na consolidação das políticas de convivência no Piauí que, contraditoriamente, concentra uma parcela mais rica do semiárido brasileiro e, por outro lado, ocupa os últimos lugares em nível de pobreza no país.
Com relação ao Ceará, com a eleição de Camilo Santana (PT), e Minas Gerais, com vitória de Fernando Pimentel (PT), ambos são governadores novos, portanto, não temos ainda informações quanto às experiências destes gestores na área das políticas de desenvolvido no semiárido. No entanto, são estados com movimentos e organizações sociais fortes no campo da luta pela convivência, portanto, acreditamos que há possibilidades concretas de avanços nesta área.
Quanto aos outros estados, temos boas perspectivas, considerando que os governadores eleitos estão na base de apoio da presidente Dilma e tiveram o apoio de partidos de centro esquerda ligados à luta em defesa da convivência com o semiárido. Na Paraíba, tivemos a eleição de Ricardo Coutinho (PSB), apoiado pelo PT e demais partidos da base do governo; no Pernambuco, tivemos a eleição de Paulo Câmara (PSB), que não teve o apoio da base do governo, mas pode dar continuidade ao bom trabalho desenvolvido pelo ex-governador Eduardo Campo.
No entanto, temos dúvidas com relação aos estados do Rio Grande do Norte, com a eleição de Robinson Farias (PSD), Sergipe, com a eleição de Jackson Barreto (PMDB) e Alagoas com a eleição de Renan Filho (PMDB) que, apesar de terem sido eleitos com o apoio dos partidos de centro esquerda, são lideranças ligadas aos grupos políticos mais tradicionais no Nordeste.
O fato de termos um cenário favorável, por si só, não significa que teremos avanços no campo das políticas de convivência com o semiárido, pois tivemos também nas Assembléias Legislativas e no Congresso Nacional o fortalecimento das forças conservadores – ligadas ao agronegócio e as políticas de combate a seca – que irão disputar os espaços públicos e as políticas do Estado, tanto nos governos estaduais quanto no governo federal, utilizando seus mecanismos de poder e controle do Estado. Além disso, é crescente dentro deste cenário, o ideário desenvolvimentista iniciado no primeiro governo da Dilma, voltado à construção de grandes obras e às políticas de industrialização, com a instalação de grandes empresas no semiárido para a exploração de reservas naturais, dentre outras atividades centradas no uso predatório do ambiente e dos próprios seres humanos.
Desse modo, o avanço e a consolidação das políticas de convivência com o semiárido estão associados à capacidade das organizações e movimentos sociais em continuar as suas lutas, por um lado, mobilizando e organizando os grupos sociais nos estados, por outro, aprofundar o processo de construção coletiva de projetos e propostas de convivência e sustentabilidade, gestadas a partir das especificidades sociais, culturais, políticas e econômicas dos vários semiáridos, que compõem o sertão brasileiro.
Neste cenário, tem um aspecto que considero essencial: o aprofundamento do debate sobre as políticas de educação desenvolvidas no semiárido brasileiro, tanto pelas escolas da educação básica, quanto pelas universidades e os institutos federais de educação. A Rede de Educação no Semiárido Brasileiro (RESAB), que congrega organizações sociais e instituições públicas, em torno da discussão e elaboração de projetos de educação para a convivência com o semiárido, vem desde 2003, promovendo inúmeros eventos de formação e mobilização política e social, no entanto, os resultados alcançados limitam-se muitas vezes aos projetos de governo de alguns municípios.
Diferente dos projetos na área do desenvolvimento social e produtivo, centrado na captação da água para o consumo humano e a produção de alimentos, que tiveram significativos apoios e reconhecimentos do governo federal, as propostas no campo da educação contextualizada não vem obtendo a atenção e os investimentos necessários, tanto dos governos estaduais e municipais, quanto dos governos estaduais e municipais e, principalmente do Governo Federal. Em parte, devido à complexidade que envolve o próprio sistema educacional, com toda uma sistemática fechada e burocratizada, construída com o intuito de disseminar um modo de pensar e produzir conhecimento associado ao modelo hegemônico e dominante de desenvolvimento.
Por outro lado, temos ainda uma luta fragmentada entre os movimentos e organizações sociais em torno das políticas de educação para o semiárido. Alem disso, temos a dificuldade de alguns movimentos e organizações sociais em compreenderem a importância da educação enquanto instrumento político essencial à construção das políticas e dos projetos de convivência com o semiárido.
Dessa forma, compreendemos que a ampliação do debate e a articulação entre a RESAB, Asa Brasil e as demais articulações e movimentos sociais que atuam na luta pela construção de novas políticas de convivência com o semiárido, é fundamental para avançarmos na construção de projetos educativos que, valorizando os saberes e as práticas sociais dos sertanejos, fomentem a construção de conhecimentos e tecnologias sociais voltadas a construção de desenvolvimento, centrado na perspectiva da convivência e da sustentabilidade no sertão brasileiro.   
Por: Elmo de Souza Lima

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